quarta-feira, 30 de julho de 2008

O LUCRO DOS BANCOS E A SAÚDE DOS BANCÁRIOS

No terceiro artigo da sobre as mudanças no perfil da categoria dos bancários, o Portal da CTB aborda a relação inversa entre o lucro dos bancos e o salário dos bancários. Outro aspecto das mudanças ocorridas no setor é o agravamento das condições de saúde da categoria.

Por Osvaldo Bertolino

Segundo o presidente da CTB-BA e do Sindicato dos Bancários da Bahia, Adilson Araújo, os bancos fizeram da política de achatamento salarial e do uso de mecanismo para burlar a legislação trabalhista um meio de aumentar os lucros. “Após o impacto inicial do Plano Real com o fim da receita inflacionária, os bancos passaram a acumular sucessivos recordes de lucratividade com aumentos expressivos de receitas e redução de custos — tarifas e spread elevados de um lado, e demissões e terceirizações de outro”, diz.

Ele mostra alguns dados que comprovam a relação inversa entre a queda dos salários e dos benefícios da categoria e os ganhos dos bancos. Segundo Adilson, entre 1994 e 2006 a receita de prestação de serviço global dos onze maiores bancos registrou um aumento real (acima da inflação) de 222% em relação ao “Índice Geral de Preços — Disponibilidade Interna (IGP-DI)”, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). No mesmo período, a despesa de pessoal total destes bancos caiu 34,6%, o que resultou num aumento real de 611,3% do lucro líquido global.

Condições degradantes de trabalho

A categoria também tem se debatido com problemas relacionados à saúde do trabalhador. “Temos estudos que mostram o impacto destas mudanças na saúde mental, decorrentes do mal-estar e tensão no trabalho”, diz Marcão Fonteles, secretário-geral do Sindicato dos Bancários PA-AP e presidente da CTB-PA. Segundo ele, para os bancários o estresse e a tensão já se tornaram elementos do cotidiano do trabalho.

Marcão explica que esse quadro de estresse e tensão evolui para conseqüências graves. “Entre os principais indicadores de desgaste à saúde mental temos nervosismo, ansiedade, tensão, fadiga, cansaço, desestímulo, desespero e depressão”, afirma. “Por vezes, há também perda de apetite, distúrbios de sono, além da contaminação involuntária do tempo de lazer — ou seja, os trabalhadores que não conseguem desligar-se das pressões", explica. “Estes desconfortos são indicativos de que há algo no trabalho e na vida que precisa ser modificado”, diz Marcão.

Mas, com a necessidade de manter o emprego, o trabalhador se sujeita a condições degradantes de trabalho. “A ameaça de demissão é uma constante e produtora de sofrimento”, afirma Marcão. “Um grande exemplo na categoria bancária são os casos de LER/DORT, que acarretam, além da dor contínua, uma verdadeira peregrinação entre médicos e perícias na busca pelo reconhecimento da doença e do tratamento adequado”, diz ele.

Trabalho monótono e desgastante

Outra dificuldade enfrentada é o assédio das chefias — principalmente a pressão pelo fechamento de metas de vendas. “Esse agravo traz repercussões à saúde mental, como sentimentos de impotência e incapacidade”, afirma Ailson Duarte, dirigente do Sindicato dos Bancários do Estado do Ceará e da CTB-CE. “Ao mesmo tempo em que a demissão ameaça a garantia de subsistência, também pode gerar grande insegurança e sentimentos de desânimo e desespero”, afirma.

Todos esses fatores, aliados à falta de perspectiva de ascensão profissional, à impossibilidade de intervir na concepção e no planejamento de suas atividades, e à defasagem salarial tornam o trabalho bancário monótono e desgastante. Ailson diz que o movimento sindical bancário precisa intervir efetivamente no processo, lutando para modificar a organização do trabalho nos bancos e também buscando medidas de prevenção e promoção à saúde.

Denúncias na Justiça do Trabalho

Segundo ele, a prevenção consiste em medidas coletivas de melhoria e intervenção nos locais de trabalho que reduzam ou amenizem situações potencialmente causadoras de mal-estar. “Aumento do controle real dos bancários sobre as tarefas e seu trabalho, enriquecimento das tarefas e o fim da extrapolação da jornada de trabalho são alguma medidas urgentes”, enfatiza Ailson. Ele explica que é importantíssimo exigir dos bancos o cumprimento da legislação existente — como as Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho que visam à proteção dos ambientes de trabalho.

As principais ligadas ao trabalho bancário, explica Ailson, são a NR-5 (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, Cipa), a NR-7 (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), a NR-9 (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais) e a NR-17 (Ergonomia, que visa a estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores). “Os bancos criam artifícios para burlar a aplicação destas NRs e precisam ser sempre denunciados nas instâncias da Justiça do Trabalho e à população”, afirma Ailson.

Bancos mais lucrativos do mundo

Para enfrentar estes problemas, no entanto, é preciso tocar numa questão essencial: o ganho dos bancos, inclusive os estatais. As montanhas de dinheiro que são divulgadas como lucros impressionam. Em março deste ano, um levantamento da consultoria Economática colocou os bancos brasileiros pela primeira vez entre os mais lucrativos do mundo.

A Caixa Econômica Federal (CEF) fechou o primeiro trimestre deste ano com R$ 873 milhões de lucro líquido, um crescimento de 12,2% sobre igual período de 2007. O Nossa Caixa, do Estado paulista, teve lucro líquido de R$ 114,9 milhões no mesmo período — alta de 31% sobre o mesmo período do ano passado. O Banco do Brasil registrou lucro líquido de R$ 2,347 bilhões no primeiro trimestre, um crescimento de 66,6% em relação ao registrado no mesmo período de 2007.

O lucro líquido do Unibanco atingiu R$ 741 milhões no primeiro trimestre deste ano, um crescimento de 27,5% em relação ao mesmo trimestre do ano passado. O Banco Real registrou lucro líquido de R$ 652 milhões no primeiro trimestre deste ano, alta de 5% em relação ao mesmo período do ano anterior. O Banco ABC Brasil teve um crescimento de 106,4% no primeiro trimestre deste ano, para R$ 38 milhões; no mesmo período de 2007, os ganhos foram de R$ 18,4 milhões.

Os lucros do Itaú e do Bradesco

O Itaú lucrou no primeiro trimestre deste ano R$ 2,043 bilhões, contra R$ 1,902 bilhões registrados no mesmo período de 2007. O Santander anunciou lucro de R$ 688 milhões no Brasil no primeiro trimestre. O grupo informou que faturou na América Latina 729 milhões de euros (US$ 1,1 bilhão ou R$ 1,914 bilhão) e que o Brasil foi novamente o país em que mais lucrou na região, com 262 milhões de euros (US$ 393 milhões ou R$ 688 milhões) — o que representa um aumento de 16,5% em relação ao mesmo período do ano passado.

O Bradesco, maior banco privado do país, teve lucro líquido de R$ 2,102 bilhões. Em 2007, o lucro de R$ 1,705 bilhão apurado no primeiro trimestre já havia sido inédito para o período. O PanAmericano atingiu R$ 70,3 milhões no primeiro trimestre de 2008, o que representa um aumento de 31,3% em relação ao último trimestre de 2007 e 126,1% em relação ao apurado até março do ano passado. E por aí vai.

Ampla liberdade para os bancos

Em entrevista à Agência Brasil, o ex-secretário de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, Elcio Takeshi, disse que os bancos obtêm grandes lucros por conta da conjuntura econômica favorável para o sistema financeiro. "Não estão fazendo nada de ilegal, apenas aproveitando uma propriedade que o mercado brasileiro apresenta para eles", disse ele.

Uma das propriedades do mercado brasileiro é oferecer liberdade para que os bancos decidam quanto irão cobrar sobre cada tarifa — e, inclusive, decidir quais serão as tarifas existentes. Segundo Roberto Piscitelli, professor de Ciências Contábeis da Universidade de Brasília, "no caso de algumas grandes instituições a receita com tarifas bancárias é superior à própria folha de pagamento dos salários". Uma pesquisa da ABM Consulting, realizada com seis grandes bancos brasileiros, reforça a informação do professor — as recentes medidas adotadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para controlar as tarifas mostraram-se ineficientes.

Ganhos de tesouraria do bancos

O estudo revela que as receitas com serviços bancários, incluindo tarifas, cresceram de R$ 4,8 bilhões em 1995 para R$ 19,2 bilhões, até setembro de 2004, e já correspondem, em média, em alguns grandes bancos — como o Bradesco —, a 200% da folha de pagamento. As tarifas, entretanto, não são a única fonte de renda dos bancos. Segundo um estudo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), os ganhos com a tesouraria dos bancos chegam a 36% do total dos lucros do sistema bancário.

No estudo, "tesouraria" é a definição para ganhos com investimentos em compras de título do governo federal, que pagam as maiores taxas de juros do mundo. A Anefac ainda informa que as tarifas geram 13% dos lucros totais do sistema bancário, e receitas diversas compõem 8% desse total. De acordo com o vice-presidente da instituição, entretanto, o que mais rende dinheiro para os bancos é a concessão de créditos. O principal componente desses lucros encontra-se no alto spread cobrado no Brasil.

Alto Spread brasileiro

O spread é a diferença entre os juros que os bancos pagam na hora de captar dinheiro (pegando emprestado de outros bancos ou de poupadores) e os juros que cobram sobre os empréstimos que fazem aos tomadores (pessoas físicas e jurídicas). Enquanto as primeiras taxas são baixas, as segundas são altas — como é o caso do cheque especial. Parte da diferença entre as duas fica com os bancos e ajuda a compor os lucros.

O spread brasileiro está entre os maiores do mundo, sendo quase duas vezes maior que o da Argentina (15,4%), três vezes o da Rússia (9,1%) e nove vezes o dos Estados Unidos (3%) — segundo o Instituto de Estudo para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), baseado em dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). Uma pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostra que os brasileiros pagam R$ 73 bilhões, por ano, em spread . Para se ter uma idéia, o Bradesco ganhou, só em 2004, R$ 11,1 bilhões em spread — quase o dobro do que recebeu com tarifas.

Fonte: Portal CTB

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